quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Dizem

Clint


dizem

As mãos serviam-lhe, dizem, teve medo, apodrecia no rebentar da própria força, /
a terra descia-lhe, mostrava a raiz desapegando-se de todo: agarrando-se a tudo, erecta;/
obrigou-se a uma certa idade, dizem, no corpo, algures, suporta-se a correcção, em qualquer lugar poderia/ encrostar uma expressão, até se ver na pele o visco que a adormece e a acorda, como no postiço riso se vê/ o vestígio de uns dentes dormindo dentro de um coração; vestia-se de circunstância/
– a fenda, dizem ( hirta implacável ) /
traria um qualquer mundo, trataria dele como qualquer outro – mas ali o corpo/
não lhe cabia, a sua vitrina saia-lhe pela boca: "Um dia escreverás que te dei um beijo,/
aí onde os olhos se servem de tudo"; um riso emaranhou-lhe o rosto dessa certeza e viu, póstumo, em/ muitos olhos, o tal riso, a carne mal ocupada, esse tal gozo, dizem; /
voltou-se para o corpo e dançou pela noite, esse lugar furtivo – o corpo aguentou, ouve /
o que faz dançar as carnes; dizem, suporta a devassa, essa coisa da terra aí à espreita nele.

1 comentário:

Helena Figueiredo disse...

poema de um ritmo lancinante, como uma cavalgada desenfreada pelos bosques da noite.
uma linguagem relampeante que irrompe do nada como um vulcão, violenta mas
maravilhosa.

“traria um qualquer mundo, trataria dele como qualquer outro – mas ali o corpo/
não lhe cabia, a sua vitrina saia-lhe pela boca “

Esta imagem é, diria, ontológica.

Como sempre lembra-me um pouco o expressionismo corporal do Luís Miguel Nava,
poeta que eu muito aprecio.

Leio a seguinte nota:

“ Nota Importante: Nenhum verso foi considerado Editável por
qualquer Editor do País “

E pergunto:

Será que os editores desse país andarão loucos?

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L.C. Züschen